Nota sobre alegação de assédio, no dia 01/06/2021, em Uberlândia
Nos últimos dias, repercutiu nas redes sociais o relato de uma passageira que alegou ter sofrido assédio sexual por parte de um motorista de aplicativo em Uberlândia. No caso descrito, consta também um vídeo com movimentações encaradas como um ato de masturbação – que foi posteriormente contestado por análises que questionaram se nas imagens o que aparecia era o órgão genital do homem ou a mão posta de modo que causasse tal impressão. Destaca-se que esta nota não traz um veredito final acerca do caso. Esse aspecto cabe aos órgãos competentes, no que diz respeito ao procedimento legal para denúncias deste tipo, considerando que foi lavrado Boletim de Ocorrência. Ademais, reiteramos que o ativismo dos movimentos em prol dos direitos das mulheres se dá em oposição ao juízo de valor negativo pré-estabelecido em torno da palavra de uma mulher, mesmo que haja os devidos trâmites de apuração de denúncias com adequação aos princípios da Justiça, que em um Estado Democrático de Direito devem ser seguidos, tanto em relação à denunciante quanto ao acusado.
Se não for para uma sentença, por que, então, nos posicionarmos sobre o caso?
No dia 01, estava em sessão plenária e fui acionada por um familiar da moça me pedindo ajuda. Estavam realizando ocorrência policial e, como de praxe, recomendei buscarem a ong SOS Mulher Família para que ela pudesse se fortalecer com o atendimento social, psicológico e orientações jurídicas. Também passei a ele todos os contatos da rede local para enfrentamento a violências contra mulheres e solicitei que fosse me colocando a par dos desdobramentos. Porque muitas questões que perpassam por ele estão diretamente ligadas à necessária reflexão e proposição sobre a constante sensação de insegurança que atravessa a vida das mulheres, não apenas em nossa cidade, mas em nosso país e em tantos outros lugares. Não apenas no transporte, seja ele particular ou público, mas em diversas outras esferas e momentos de nossas vidas cotidianas. Exposições individuais nas redes não são o método adequado – e sobretudo não são suficientes – para tratativa de questões tão complexas e que se relacionam a problemas estruturais enraizados na nossa sociedade, dores com as quais lido diretamente há anos, principalmente por meio do trabalho desenvolvido na Ong SOS Mulher e Família, Conselho dos Direitos das Mulheres e Núcleo de Estudos sobre masculinos e femininos da Universidade Federal de Uberlândia. No entanto, é preciso refletir sobre todos os episódios de violências que vieram antes e também sobre os sentimentos despertos nas múltiplas formas de violências vivenciadas, para que uma mulher recorra a esse meio de divulgação virtual, ainda que problemático, como ferramenta de proteção de si e de outras.
É por isso que, para evitar precipitações, acolher, encaminhar e também averiguar da maneira adequada uma denúncia, precisamos do fortalecimento e da divulgação do fluxo de instituições e organizações governamentais e não-governamentais que atuam na área. Não compactuamos com a perspectiva da exposição ou de linchamento social ou literal, virtualmente, ou fora das redes sociais digitais como meio de resolução de conflitos. Enxergamos esse tipo de iniciativa como um sintoma do quanto ainda precisamos avançar no efetivo acesso das mulheres aos mecanismos de escuta e de atendimento de suas demandas. É necessária também uma constante qualificação desse debate em nossos espaços de proteção aos direitos das mulheres, para que se evite a banalização de práticas que trazem mais riscos do que benefícios. É preciso que seja incentivada a orientação sobre como proceder de forma prudente, mesmo com as barreiras emocionais comuns a situações assim, em casos em que uma mulher se sinta ofendida ou ameaçada.
Reforçamos que não somos adeptas à ‘demonização’ da categoria dos/as motoristas de aplicativo, que inclusive conta com muitas mulheres em seu quadro de trabalhadores/as e que precisam garantir seu sustento e de suas famílias, em condições de trabalho e remuneração precárias, num país e cidade assolados pela crise. A sensação de insegurança das mulheres e possíveis casos de assédios sexuais ocorridos nessas situações são uma expressão de um problema que é social e que atinge também as motoristas, e não algo a ser automaticamente associado a essa profissão ou como argumento para desqualificá-la.
Desde o início do mandato, um dos projetos presentes em nosso planejamento é o de, além de buscar garantir a segurança nos ônibus do transporte público municipal, estabelecer parcerias com motoristas e empresas que atuam no segmento das viagens particulares. Empresas como Uber e 99 já divulgaram dados sobre identificação de casos de violências às mulheres em seus trajetos, que podem colaborar para o desenvolvimento e aprimoramento de mecanismos de conscientização e combate a essas práticas. Em uma pesquisa realizada em 2019 pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva, com apoio da Uber, 97% das 1.081 mulheres entrevistadas afirmaram ter sofrido algum tipo de assédio sexual no transporte público, por aplicativo ou táxi. Já a 99 compartilhou, em 2020, que as denúncias de assédio e abuso sexual corresponderam à maior parte das denúncias registradas no aplicativo (23%), feitas por passegeiros/as ou motoristas; segundo a plataforma, à época cerca de 730 pessoas eram banidas por semana, devido a assédio sexual, fato que da mesma forma vale não só para motoristas, mas também para passageiros/as.
Dito isto, sentimos a necessidade de nos expressar e promover a reflexão também sobre a atitude de um grupo que foi até o local de trabalho da moça que divulgou o caso, assim como estiveram na porta da Câmara Municipal, para se manifestarem a respeito do ocorrido. Apesar de compreendermos a preocupação da categoria dos/as motoristas e a necessidade de apuração sobre o que de fato aconteceu, para que nenhuma injustiça seja cometida ou incentivada, nós lamentamos o modo como ocorreu a manifestação. Não questionamos a legitimidade do direito de expressão das diferentes visões sobre um mesmo assunto. Porém a forma hostil, não colabora para a resolução e o entendimento entre as partes. Desse modo, todos/as envolvidos/as perdem. Enquanto membro de uma mesma legislatura, em tempos de criminalização da política, com generalizações sem fundamentação, de disseminação do ódio, de projetos de poder destrutivos que se alimentam de polarizações, acreditamos que pode ser encontrada uma maneira adequada de dialogar com a colega vereadora em questão e sua equipe sobre seus posicionamentos. Afinal, em qualquer situação, um equívoco não justifica outro. De qualquer modo, a indignação não dá licença para práticas ofensivas. Cremos nas relações pautadas pelo diálogo e o respeito.
Enfim, o #mandatodasasvozes da vereadora Cláudia Guerra se coloca à disposição da população para o diálogo e mediação com os sujeitos dessa história e seus pontos de vista e perspectivas que vão para além dela. Se de fato houve um equívoco na acusação, desejamos que seja devidamente reconhecido e retratado. E que o ocorrido proporcione aprendizado, sem perseguição ou ameaças a quem quer seja. Tampouco seja utilizado para descredibilizar ou desestimular a busca de ajuda pelas mulheres em outros casos. Do mesmo modo em que estivemos abertas ao acolhimento da denunciante, estamos a ouvir o que têm a dizer os/as motoristas. Essa é uma postura que faz jus ao protagonismo que a defesa dos direitos das mulheres tem em nosso mandato, sob a ótica de que é possível lidar com caso e seus impactos por meio do diálogo e levando em conta outros aspectos da nossa realidade como o trabalho, a saúde, a educação na coletividade, o que deve incluir também os homens. Tivemos boas práticas em Uberlândia, nesse sentido, onde homens tiveram a iniciativa de colocar em seus carros adesivos com contatos de instituições de enfrentamento às violências às mulheres, replicando informação e contribuindo para a nossa rede de proteção. Sejamos propositivos/as e construtivos/as. Vamos multiplicar essas boas práticas de responsabilidade social e que agregam valor aos serviços prestados? Nosso propósito é contribuir, agora também no Poder Legislativo, para que atitudes como essa se tornem cada vez mais comuns. Acreditamos que essa categoria de trabalhadores/as seja parceira e queremos nos somar a essa causa para que a locomoção por aplicativo seja segura para mulheres e homens, passageiros/as e motoristas. Porque o enfrentamento às violências e a qualquer forma de discriminação contra minorias sociais e maiorias excluídas benefícia toda a comunidade e estabelece a cultura da paz com vozes.
Experiência pra escutar, coragem pra fazer, com o propósito de que “transformar a vida das mulheres melhora a vida de todas as pessoas”.
Mandato TodasAsVozes – Vereadora Cláudia Guerra
Pesquisa
Dicas post
Checar se o modelo e a placa do carro batem com o descrito no aplicativo e perguntar ao motorista como ele se chama; avisar alguém quando você entrar em um carro; compartilhar ou fingir que a viagem está sendo compartilhada com alguém; sentar-se atrás do banco do motorista onde ele não tenha visão de você; colocar o celular para despertar a cada três minutos, e sempre que despertar, atender como se fosse alguém da sua família; falar a marca, cor placa e outras informações do carro e informe quantos minutos faltam para chegar; não beber água e nem aceitar bombom; e compartilhar a localização em tempo real pelo WhatsApp.
Procedimento legal de denúncia
Não sei se damos uma dica tipo “cuidado com a exposição” pq isso pode se voltar contra a vítima.
Solidarizar com Dandara e com todas as mulheres que estão cotidianamente passando por situações de risco de violência ou de violência propriamente dita.